sexta-feira, 23 de abril de 2010

Fernando Pessoa/ Ricardo Reis - "O que sentimos é o que temos"

O que sentimos, não o que é sentido,
É o que temos.
Claro, o inverno triste
Como à sorte o acolhamos.
Haja inverno na terra, não na mente.
E, amor a amor, ou livro a livro, amemos
Nossa caveira breve.
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Odes/ Ricardo Reis

terça-feira, 20 de abril de 2010

Dias da Música no CCB

Nos próximos dias 23, 24 e 25 de Abril (Sexta-feira a Domingo) voltam ao Centro Cultural de Belém, em Lisboa, os Dias da Música, este ano inspirados na obra de Descartes, As Paixões da Alma. O programa dos concertos e restantes eventos está disponível AQUI.

sábado, 10 de abril de 2010

Fernando Pessoa/ Álvaro de Campos - Encostei-me

Encostei-me para trás na cadeira de convés e fechei os olhos,
E o meu destino apareceu-me na alma como precipício.
A minha vida passada misturou-se com a futura,
E houve no meio um ruído do salão de fumo,
Onde, aos meus ouvidos, acabara a partida de xadrez.
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Ah, balouçado
Na sensação das ondas,
Ah, embalado
Na ideia tão confortável de hoje ainda não ser amanhã,
De pelo menos neste momento não ter responsabilidades nenhumas,
De não ter personalidade propriamente, mas sentir-me ali,
Em cima da cadeira como um livro que a sueca ali deixasse.
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Ah, afundado
Num torpor da imaginação, sem dúvida um pouco sono,
Irrequieto tão sossegadamente,
Tão análogo de repente à criança que fui outrora
Quando brincava na quinta e não sabia álgebra,
Nem as outras álgebras com x e y's de sentimento.
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Ah, todo eu anseio
Por esse momento sem importância nenhuma
Na minha vida,
Ah, todo eu anseio por esse momento, como por outros análogos -
Aqueles momentos em que não tive importância nenhuma,
Aqueles em que compreendi todo o vácuo da existência sem inteligência para o compreender
E havia luar e mar e a solidão, ó Álvaro.
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Poemas/ Álvaro de Campos

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Fernando Pessoa/ Ricardo Reis - "O passado é o presente na lembrança"

Se recordo quem fui, outrem me vejo,
E o passado é o presente na lembrança.
Quem fui é alguém que amo
Porém somente em sonho.
E a saudade que me aflige a mente
Não é de mim nem do passado visto,
Senão de quem habito
Por detrás dos olhos cegos.
Nada, senão o instante, me conhece.
Minha mesma lembrança é nada, e sinto
Que quem sou e quem fui
São sonhos diferentes.
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Odes/ Ricardo Reis