terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Ana Hatherly, A história do mundo

A história do mundo
é uma autobiografia inventada
é a história
dum Paraíso desencontrado
dum velho-novo-mundo
pr'a sempre ultrajado
p'la enorme cintilação do oiro

Ah
como é desigual
a viagem da descoberta!

Entre a cópia e a falta
ante o vexame do despenho
uma pergunta maléfica nos assalta:
Que fazer?

A alma 
não tem que fazer nada
dizia um célebre quietista...


Ana Hatherly

in Itinerários, Edições quasi, 2003

Bach - Cantata BWV 243 1.Magnificat in D Major

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Carlos Drummond de Andrade, Estrambote melancólico


Tenho saudade de mim mesmo,
saudade sob aparência de remorso,
de tanto que não fui, a sós, a esmo,
e de minha alta ausência em meu redor.
Tenho horror, tenho pena de mim mesmo
e tenho muitos outros sentimentos
violentos. Mas se esquivam no inventário,
e meu amor é triste como é vário,
e sendo vário é um só. Tenho carinho
por toda perda minha na corrente
que de mortos a vivos me carreia
e a mortos restitui o que era deles
mas em mim se guardava. A estrela-d’alva
penetra longamente seu espinho

(e cinco espinhos são) na minha mão.

Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

In Um eu todo retorcido, Antologia Poética, Círculo de Leitores, Lisboa, 2003

domingo, 11 de dezembro de 2011

Ana Hatherly, "O poeta não quer duplicar o mundo"


O poeta não quer duplicar o mundo
não quer fazer dele uma cópia:

Luta com a palavra
como Jacob lutou com o anjo
mas a escada que ele sobe
conduz a outras alturas
a outras planuras

É assim que o poeta
palavra por palavra
como pedra sobre pedra
constrói o edifício do poema

E a sua mão
robótico instrumento comandado
pela algébrica lógica do sentido oculto
produz
deve produzir
o que o mundo não tem
o que o mundo não diz
o que o mundo não é.
Ana Hatherly
in A Idade da Escrita

sábado, 3 de dezembro de 2011

"RECOMEÇAR", de Drummond ou de Gaefke?


No mundo maravilhoso da Internet, por vezes deparamo-nos com coisas como esta: uns atribuem a autoria deste texto a Carlos Drummond de Andrade, outros a Paulo Roberto Gaefke, mencionando até o livro “Decidi ser Feliz” onde Gaefke o terá publicado. Ora, como o nome do livro, e o próprio texto, podem indicar aquele tipo de literatura de auto-ajuda/ reflexão, que, confesso, desconheço em Drummond de Andrade, seria bom se alguém conseguisse dizer-me o nome do livro, e outras referências, onde Drummond o terá publicado, pois só com estes elementos poderei desfazer qualquer equívoco. A única frase que tem autor certo é a última, pois é do nosso Fernando Pessoa/ Alberto Caeiro e está devidamente entre aspas.
RECOMEÇAR

Não importa aonde você parou...
Em que momento da vida você cansou...
O que importa é que sempre é possível e necessário "Recomeçar".
Recomeçar é dar uma chance a si mesmo...
É renovar as esperanças na vida e o mais importante...
Acreditar em você de novo.
Sofreu muito nesse período?
Foi aprendizado...
Chorou muito?
Foi limpeza da alma...
Ficou com raiva das pessoas?
Foi para perdoá-las um dia...
Sentiu-se só por diversas vezes?
É porque você fechou as portas até para os anjos...
Acreditou que tudo estava perdido?
Era o início da sua melhora...
Pois é...
Agora é hora de reiniciar...
De pensar na luz...
De encontrar prazer nas coisas mais simples de novo...
Que tal um novo emprego?
Um corte de cabelo arrojado...
Diferente?
Um novo curso...
Ou aquele velho desejo de aprender a pintar...
Desenhar...
Dominar o computador...
Ou qualquer outra coisa...
Olha quanto desafio...
Quanta coisa nova nesse mundão de meu Deus, o esperando.
Está se sentindo sozinho?
Besteira...
Tem tanta gente que você afastou com o seu "período de isolamento"...
Tem tanta gente esperando apenas um sorriso seu para "chegar" perto de você.
Quando nos trancamos na tristeza...
Nem nós mesmos nos suportamos...
Ficamos horríveis...
O mal humor vai comendo nosso fígado...
Até a boca fica amarga!
Recomeçar...
Hoje é um bom dia para começar novos desafios.
Onde você quer chegar?
Ir alto...
Sonhe alto...
Queira o melhor do melhor...
Queira coisas boas para a vida...
Pensando assim trazemos para nós aquilo que desejamos...
Se pensamos pequeno...
Coisas pequenas teremos...
Já se desejarmos fortemente o melhor e, principalmente, lutarmos pelo melhor, o melhor vai se instalar na nossa vida.
E é o hoje o dia da faxina mental...
Joga fora tudo que te prende ao passado...
Ao mundinho de coisas tristes...
Fotos...
Peças de roupa, papel de bala...
Ingressos de cinema, bilhete de viagens...
E toda aquela tranqueira que guardamos quando nos julgamos apaixonados...
Jogue tudo fora...
Mas, principalmente, esvazie seu coração...
Fique pronto para a vida...
Para um novo amor...
Lembre-se: somos apaixonáveis...
Somos sempre capazes de amar muitas e muitas vezes...
Afinal de contas...
Nós somos o "Amor".
"Sou do tamanho daquilo que vejo e não do tamanho da minha altura".