sábado, 29 de agosto de 2009

Desabafos da Luísa (3)




Programas eleitorais do PSD e do PS

Encontrei a Luísa muito introspectiva e quis saber o motivo daquele remoer interior, ao que ela respondeu: - Agora que Manuela Ferreira Leite pôs no papel o que se propõe fazer se ganhar as próximas eleições legislativas, e comparando este programa de governo com o de José Sócrates, fiquei um pouco desiludida com o facto de dois partidos, PSD e PS, que se situam na área da social-democracia, não terem uma visão de futuro, portanto de longo prazo, para Portugal.
No do PSD propõe-se, em casos específicos, fazer de maneira diferente o que o PS fez nesta legislatura. Por exemplo, no que respeita ao estatuto da carreira docente e à avaliação, coloca-se ao lado dos professores mas, por outro lado, exige que os magistrados e juízes sejam avaliados pela qualidade e quantidade dos seus desempenhos e faz depender disso as respectivas remunerações. Quer dizer, vamos deixar de ver os professores na rua e passamos a ver juízes e magistrados em manifestações, se Ferreira Leite ganhar as eleições. Fala ainda no encurtamento dos prazos das decisões judiciais, só que isso não depende dela, uma vez que os prazos processuais estão todos definidos na Lei, e as leis têm de ser aprovadas pela Assembleia da República! Lá teremos mais alterações ao Código do Processo Penal, isto admitindo que a corporação de juízes e magistrados fique muito sossegadinha. Não nos podemos esquecer que os Tribunais constituem um órgão de soberania (embora não pareça pelos sindicatos que os magistrados formaram) e, por isso, tudo o que gira à sua volta tem um poder de influência que a corporação dos professores não tem. Resumindo: só este pormenor do programa do PSD já dá para afligir e prever, se for adiante, uma agitação e uma instabilidade insuportável. Eu tenho consciência de que as crises é que devem ser consideradas a regra e a estabilidade a excepção, que são as crises que nos permitem fazer rupturas com o que está errado e fazer escolhas mais acertadas para resolver os problemas. Mas uma coisa é isso e outra coisa é vivermos diariamente num pandemónio que só os magistrados sabem fazer quando lhes chega a mostarda ao nariz. Os médicos, os enfermeiros e os professores, em comparação, são uns santos, devido à diferença no poder de influência que aqueles possuem. E se a lentidão da Justiça tem sido um dos nossos calcanhares de Aquiles para o investimento estrangeiro em Portugal, com mais essa perturbação é bem possível que o desemprego atinja os 11% ou 12%, senão mais, já que Ferreira Leite também não quer investir em grandes obras públicas.
Outro pormenor do programa do PSD que me deixou a pensar é o da cobrança do IVA. Os empresários e empresas só entregarão o IVA às Finanças quando o tiverem recebido dos clientes, e não, como agora, que têm prazos determinados, ao longo do ano, para o fazerem, independentemente de já o terem recebido. Tal implica que o Estado vai ficar com menos dinheiro disponível e em prazos regulares e previsíveis para cumprir as suas obrigações, ficando sem se saber quando é que esses montantes entrarão nos cofres do Estado pois ficam dependentes dos bons e maus pagadores dentro do tecido empresarial. Creio que esta medida introduz um grão de areia na engrenagem, para não dizer um pedregulho.
Manuela Ferreira Leite também se propõe acabar com as taxas moderadoras para internamentos e cirurgias hospitalares, de que já estão isentos mais de 50% dos cidadãos, o que significa que essa medida abrangeria apenas os restantes e, desses, apenas os que são tratados em hospitais públicos. Salvo erro, por cada dia de internamento paga-se actualmente € 5,00, pelo que, por aí, não viria o Serviço Nacional de Saúde abaixo. Já quanto à descida da taxa social única em 2% para os empregadores, tenho dúvidas que o Fundo da Segurança Social, que com o sacrifício de todos se conseguiu estabilizar e garantir as reformas a mais longo prazo e a agilização no pagamento dos subsídios de desemprego, não venha a conhecer de novo as dificuldades de outrora. E como Ferreira Leite também quer alargar os períodos de concessão dos subsídos de desemprego, mesmo que temporariamente, quer dizer, menos dinheiro a entrar e mais dinheiro a sair. Nada disto faz sentido na minha cabeça.
Surgiu-me, inclusivé, uma ideia maluca para evitar este faz e desfaz todos os 4 anos; é que a duração de cada legislatura fosse de 8 anos, com orçamentos quadrienais, e que a meio da legislatura se fizesse o balanço da acção governativa, podendo os cidadãos serem chamados a pronunciar-se sobre a mesma, não com a finalidade de substituir o partido no governo mas para avaliar a sua gestão e, consoante o veredicto cidadão, dar oportunidade ao governo em funções de corrigir o que houvesse a corrigir. Para assegurar o regular funcionamento das instituições já existe um órgão de soberania que é a Presidência da República, não se colocando, assim, nem o espectro da ditadura nem da anarquia. Sempre o Estado de Direito, embora eu preferisse um Estado de Justiça. E com esta me vou.
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(uma nota: enquanto estive a escrever em papel as apreensões da Luísa, vi que um cartaz enorme da campanha de Manuela Ferreira Leite caíu do seu suporte, rasgou-se e andou ao sabor do vento, enquanto um vizinho do prédio ao lado tentava arrastar os destroços para não irem para a estrada perturbar o trânsito. Ah! o da CDU, que estava num poste de iluminação, também foi abaixo. Esta brisa cruzada entre as serras de Carnaxide, de Sintra e o Atlântico faz destas coisas! O pessoal da Câmara de Oeiras não demorou a vir recolhê-los, o que quer dizer que o vizinho os chamou. Como entre a queda dos cartazes e a sua recolha decorreu apenas meia-hora, parabéns ao vizinho pelo gesto de cidadania e à Câmara pela rapidez. Quanto ao resto, é pura coincidência.)

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