sábado, 22 de agosto de 2009

Manuel Bandeira - Madrigal Melancólico

O que eu adoro em ti,
Não é a tua beleza.
A beleza, é em nós que ela existe.
A beleza é um conceito.
E a beleza é triste.
Não é triste em si,
Mas pelo que há nela de fragilidade e de incerteza.
.
O que eu adoro em ti,
Não é a tua inteligência.
Não é o teu espírito subtil,
Tão ágil, tão luminoso,
-Ave solta no céu matinal da montanha.
Nem é a tua ciência
Do coração dos homens e das coisas.
.
O que eu adoro em ti,
Não é a tua graça musical,
Sucessiva e renovada a cada momento,
Graça aérea como o teu próprio pensamento,
Graça que perturba e que satisfaz.
.
O que eu adoro em ti,
Não é a mãe que já perdi.
Não é a irmã que já perdi.
E meu pai.
.
O que eu adoro em tua natureza,
Não é o profundo instinto maternal
Em teu flanco aberto como uma ferida.
.
Nem a tua pureza. Nem a tua impureza.
O que eu adoro em ti - lastima-me e consola-me!
O que eu adoro em ti, é a vida.
.
(11 de Julho de 1920)
.
Manuel Bandeira (Recife, 1886-1968)

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