terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Fernando Pessoa/Ricardo Reis - "Quanta tristeza e amargura" e "Cada dia sem gozo não foi teu"

Quanta tristeza e amargura
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Quanta tristeza e amargura afoga
Em confusão a 'streita vida!
Quanto Infortúnio mesquinho
Nos oprime supremo!
Feliz ou o bruto que nos verdes campos
Pasce, para si mesmo anónimo, e entra
Na morte como em casa;
Ou o sábio que, perdido
Na ciência, a fútil vida austera eleva
Além da nossa, como o fumo que ergue
Braços que se desfazem
A um céu inexistente.
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Cada dia sem gozo não foi teu
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Cada dia sem gozo não foi teu
Foi só durares nele. Quanto vivas
Sem que o gozes, não vives.
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Não pesa que amas, bebas ou sorrias:
Basta o reflexo do sol na água
De um charco, se te é grato.
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Feliz o a quem, por ter em coisas mínimas
Seu prazer posto, nenhum dia nega
A natural ventura!
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Odes/Ricardo Reis

7 comentários:

Manuela Freitas disse...

Olá Josefa,
Vou lendo e relendo as poesias de FP(s), que vai publicando. É sempre com muito prazer que o faço!...
Deixo um beijo desejando que esteja bem,
Manuela

Miguel Gomes Coelho disse...

Maria Josefa,
Volto a gostar muito.´
O "carpe diem" a baloiçar segundo julgo entre o estoicismo do primeiro e o maior epicurismo do segundo. Não ?
E uma proximidade ao Mestre Alberto Caeiro ?
Há pessoas que não acreditam que me pôem a trabalhar... :º))
Mas é muito bom ler isto.
Obrigado.
Um abraço grande.

Maria Ribeiro disse...

"CARPE DIEM"... os deuses é que mandam na vida do homem; por isso, há que gozar a vida e aproveitá-la, da melhor maneira possível! Quando a "HORA" chegar,nada mais a fazer...
BEIJO de
LUSIBERO

Maria Josefa Paias disse...

Obrigada, Manuela, fico feliz por isso!
Desde que faça sol, estou bem. Beijinho:)

Maria Josefa Paias disse...

Miguel, se me permite, vou escrever como faço a maior parte das vezes, com palavras simples e comuns, sem utilizar nomes de correntes filosóficas, nem de figuras de estilo literárias, para que todos os que lerem entendam mais facilmente.
A meu ver, a primeira Ode de Ricardo Reis reflecte o que ele sente sobre a vida que o oprime com tantas tristezas e infortúnios, achando que será mais feliz aquele que por ela passe "para si mesmo anónimo", ou seja, aquele que não pensa sequer no sentido das coisas nem no da sua existência.
Na segunda Ode, vejo que ele gostaria de ser como aqueles a quem "o reflexo do sol na água de um charco" é suficiente para se sentirem gratos pela vida, aqueles que têm "em coisas mínimas o seu prazer posto" e a esses "nenhum dia nega a natural ventura", ao contrário dele, para quem essas pequenas coisas não são suficientes.
E por tudo isto, está muito distante do Mestre Caeiro, se bem se lembra dos poemas que já publiquei, onde o deleite em olhar as plantas, as aves, as pedras, a natureza em geral, transmitem até alegria pela vida. Caeiro não queria pensar as coisas, apenas olhar o que tinha à sua volta, ou pensar mas com os olhos, como ele diz.
Muito obrigada e um grande abraço.

Maria Josefa Paias disse...

Maria Ribeiro, muito obrigada pelo seu comentário e continue a aproveitar os seus dias o melhor possível :))
Beijinho.

Miguel Gomes Coelho disse...

Uff!!!Maria Josefa,
Ainda não sei se me conseguiu alinhar as ideias ou desalinha-las.
Sobre a interpretação das odes creio que estamos de acordo, e peço desculpa por ter utilizado a fraseologia encriptada que utilizei, mas julgo que conduz ao mesmo desfecho.
Quanto a uma proximidade a Alberto Caeiro, foi algo que senti, no discurso e no sentir das imagens.No tal reflexo do sol...
Mas vou reestuda-las e pensar na validade da minha apreciação.
Mas, é claro, sempre um muito obrigado pelo incentivo das suas palavras.
Um abraço grande.